segunda-feira, 14 de dezembro de 2009
Análise do Poema "D. Dinis"
2
2.1) e 2.2)
O ambiente de mistério é criado sobretudo na primeira estrofe: “um silêncio murmuro” que só ao rei é dado ouvir “ o rumor dos pinhais (…) sem se poder ver”, isto é só acessíveis a sonhadores, porque só o futuro os revelará como “ trigo/de império”; na segunda estrofe refere-se, ainda, “a fala dos pinhais ” que é um “marulho obscuro”
3
3.1) A metáfora remete por os pinheiros plantados pelo D. Dinis, que são já virtualmente as naus das descobertas – O futuro adivinhado, o rei aparece assim, como aquele que criou as condições para os descobrimentos.
3.2) Nos versos 6 e 7 o cantar jovem e puro é apresentado como um regato que corre em direcção ao oceano; Também estes versos encerram a ideia de que neste passado se adivinha já o futuro.
4
4.1) Os versos 2, 4, 5, 10 conciliam os dois ciclos da nossa história.
1 Pagina 17
1.1) D. Dinis é aqui apresentado como um digno sucessor do rei cessante D. Afonso. O reino floresceu e progrediu em constituições leis e costumes que eliminavam a terra que já vive em paz.
Na estrofe 97 sabemos que ele foi o primeiro a estabelecer o ensino em Coimbra, por fim na estrofe 98 somos informados que D. Dinis fundou novas vilas construiu fortalezas e renovou todo o reino.
2
2.1) As facetas de D. Dinis postas em relevo nestes versos são as de povoador e fundador da universidade. Já Fernando pessoa evidencia as suas facetas de lavrador e poeta. Enquanto Camões interessou-se particularmente pela visão histórica pessoa interessou-se pela visão mítica, visionária, rei capaz de antever o futuro.
Análise do Poema "D. Sebastião Rei de Portugal"
Análise do poema "O dos Castelos" de Fernando Pessoa e a sua intertextualidade com Luís de Camões
Análise do poema "O Nevoeiro
-Versos 8 e 9
1.3)O verso 10º encontra-se entre () uma vez que representa uma expressão de inquietação formulada pelo sujeito poético, espécie de premonição de que algo está para acontecer.
2.1)
Este verso é uma afirmação triunfal de esperança. “ É a hora!” de assumirmos novamente o sonho, é o apelo á construção de um novo futuro. Se tudo está “morto” é a hora de renascer.
Análise Mar Português
Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!
Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma nãe é pequena.
Quem que passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.
1) O Poema que acabaste de ler é constituído por duas estrofes, a primeira marcadamente épica e a segunda de pendor lírico.
1.1) Prova a veracidade da afirmação de 1. sintetizando o conteúdo de cada estrofe.
R: Na 1ª estrofe o sujeito poético, apresenta uma realidade epica, é a sintese da história de um povo e dos sacrifícios que teve de sofrer para conquistar no mar.
Na 2ª estrofe, caracter reflexivo, o sujeito poético faz o balanço desses sacrifícios, concluindo que "valeu a pena" pois o sofrimento conduz à conquista do absoluto.
2) Concentra-te, agora, na 1ª estrofe.
2.1) Identifica as apóstrofes através das quais o sujeito poético se dirige ao destinatário do discurso.
2.2) Justifica o recurso à frase exclamativa na estrofe em análise.
R: As frases exclamativas pretendem realçar o sofrimento causados pela conquista do mar, àqueles que ficam em terra, nomeadaamente mães, noivas, filhos.
2.3) Interpreta o valor expressivo das repetições que aí podes encontrar.
R: A repetição do determinante interrogativo ( Quantas, quantas, quantas), aumenta o dramatismo da invocação da situação narrada.
3) Na 2ª estrofe, o sujeito poético faz uma espécie de balanço.
3.1) Explica, por palavras tuas, o sentido dos dois primeiros versos desta estrofe.
R: Nestes versos o sujeito poético considera que todos os sacrifícios são justificaveis, se o objecto que estiver na sua base for importante\nobre.
3.2) Relê a informação contida na nota 1. e explica o simbolismo do Bojador.
R: O Bojador simboliza o ultrapassar do medo, do desconhecido o 1º grande passo para o conhecimtento.
3.3)Interpreta o sentido dos vocábulos "mar" e "céu" no contexto deste poema.
R: O "mar" é símbolo de sofrimento mas também símbolo do absoluto, já que foi nele que Deus fez "espalhou o céu" e simboliza a realização do sonho e da gloria, que for capaz de conquistar o mar conseguirá chegar ao céu.
quarta-feira, 25 de novembro de 2009
Síntese do poema "O Mostrengo"
R: A acção deste poema é passada numa viagem de nau, nomeadamente no cabo das tormentas, durante uma noite escura, nessa viagem os tripulantes confrontados por um mostrengo que está no fim do mar e pretende atemorizar os portugueses para que não continuem a sua viagem. O monstro questiona a tripulação de que aqueles eram portugueses e vinham para conquistar os mares, não abdicando da sua missão.
2.1- Justifica o título do poema, referindo o processo de formação de
Palavras que está na origem do poema escolhendo pelo poeta. R: O mostrengo é caracterizado directamente por dois adjectivos “imundo e grosso”; indirectamente pelas suas acções, pois realiza movimentos circulares intimidadores e sitiantes à volta da nau. Sabemos também que vive em cavernas que ninguém conhece.
2.2- A palavra mostrengo é uma palavra composta por sufixação mostro + engo, este sufixo tem um valor pejorativo. Mostrengo significa
3- Concentra-te, agora, nas atitudes do “ homem do leme”.
3.1- Demonstra que as suas reacções ao discurso do “mostrengo” evoluem
em sentido crescente.
R: Na primeira estrofe “El rei D.Joao II” Na segunda estrofe “El rei D.Joao II” Na terceira estrofe “Linha 22 ate a 27”Às interpolações do mostrengo (primeira e segunda estrofe) o homem do leme começa por responder assustado, intimidado pelo o tom aterrador das palavras do mostrengo e pelo ambiente que o circunda, apenas com uma frase que invoca a autoridade do rei. Porém na terceira vez consciencializando-se de que não é apenas ele “Homem do leme” que ali está, assume-se como símbolo do povo e responde, em seis versos, com convicção e força.
4- Prova que ambas as figuras – o mostrengo e o homem do leme são
simbólicas.
R: O mostrengo simboliza os medos dos navegadores que enfrentam o desconhecido. O “Homem do leme” é a figura do herói mítico, símbolo de um povo e que, portanto, passa de herói individual a colectivo, com uma missão a cumprir.
5- Analisa o poema nas perspectivas morfo-sintáctico e semântica.
R: O número 3 é o número da perfeição da unidade divina; a totalidade a que nada mais pode ser adicionado
6.1- Identifica as três tipos de frase presentes no poema e explica o recurso
A cada um deles.
R:” Meus tectos negros do fim do mundo?”
“El-Rei D. João Segundo!”
“ O mostrengo que está no fim do mar
Na noite de breu ergueu-se a voar;” Neste poema as frases declarativas estão ao serviço da narração e em parte do discurso do “homem do leme “. As frases interrogativas estão presentes no discurso do mostrengo e a frase exclamativa constam do discurso do “homem do leme”.
6.2- Indica dois recursos estilísticos e salienta o respectivo valor expressivo. R: Existem neste poema várias anáforas que pretendem reforçar o que é dito.O hipérbato do verso 26 reforça o sentido simbólico do “Homem do leme”.
6.3- Justifica o predomínio dos verbos neste poema e comente o recurso aos
Tempos em que se encontram.
7-Salienta as características que fazem deste poema um dos mais Marcadamente épicos da Mensagem.
quarta-feira, 18 de novembro de 2009
V Império
Os quatro primeiros impérios eram, segundo Vieira, pela ordem: os Assírios, os Persas, os Gregos e os Romanos. O quinto seria o Império Português.
Nas escrituras Hebraicas (Antigo Testamento), na Bíblia, Padre António Vieira veio a basear este mito num trecho bíblico, que conta a história do rei Nabucodonosor e do seu sonho, com uma estátua que possuía cinco tipos de materiais.
A utopia do Quinto Império permeia a obra de Fernando Pessoa também, no livro Mensagem.
No caso de Fernando Pessoa os quatro primeiros impérios diferem dos do Padre António Vieira, sendo o primeiro o Império Grego, o segundo o Império Romano, o terceiro o Cristianismo e o quarto a Europa.
O Quinto Império foi uma forma de legitimar o movimento autonomista português, que conseguira o fim da União Ibérica.
Mito do Sebastianismo
Assim como Camões também Fernando Pessoa defende a ideia do sebastianismo (Quinto Império). Logo podemos fazer uma análise comparativa entre “Os Lusíadas” e a “Mensagem”.
Ao ler-se as duas obras nota-se uma igualdade em certos pontos, Luís de Camões fala sobre os actos heróicos dos portugueses durante a época dos descobrimentos e também sobre a espera que D. Sebastião consiga levar este império.
Fernando Pessoa fala também sobre a época dos descobrimentos, época em que Portugal brilhava no mundo, em que tinha um grande império, e também fala de D. Sebastião, mas não como Camões, Fernando Pessoa fala dele de uma forma abstracta, fala dele para representar melhor a esperança que tem em Portugal, que este volte a ser o império que já foi um dia e que chega a ser o tão esperado Quinto Império.
A quem diga que Luís de Camões é o pai da Língua Portuguesa e que Fernando Pessoa é o continuador desse caminho. Que Fernando Pessoa seguiu a obra que Camões começou, continuou o seu “legado” só que de uma forma diferente de ver as coisas.
Simbologias associadas
Mar – simboliza a vida e a morte; o nascimento, a transformação e o renascimento;
Campos – símbolo do paraíso ao qual os justos acedem depois da morte; espaço de vida e acção:
Castelo – dada a sua habitual localização num lugar mais elevado, simboliza a segurança, a protecção e a transcendência;
Quinas – os cincos escudos das armas de Portugal reenviam para as cinco chagas de Cristo, adquirindo uma dimensão espiritual;
Coroa – símbolo de perfeição e de poder: promessa de imortalidade;
Timbre – insígnia que coroa o brasão, indicadora da nobreza de quem o usa, remete para a sagração do herói numa missão transcendente;
Grifo – ave fabulosa com a força e a sabedoria, o poder terrestre e celeste;
Padrão – monumento de pedra que os navegadores portugueses erguiam nas terras que iam descobrindo; simboliza o domínio e a propagação da civilização cristã sobre as mesmas;
Monstrengo – simboliza o desconhecido, os medos, os perigos e os obstáculos que os navegadores tiveram de enfrentar e vencer;
Nau – simboliza a força e a segurança numa travessia difícil; bem como o incitamento à viagem e a uma vida espiritual; prende-se, também, com a aquisição de conhecimentos;
Ilha – símbolo do desejo de felicidade terrestre ou eterna; do além maravilhoso; da sabedoria e da paz;
Noite – simboliza a morte; remete para um tempo de gestação que desabrochará como manifestação de vida;
Manhã – símbolo de pureza; de vida para paradisíaca, de confiança em si, nos outros, na existência;
Nevoeiro – simboliza a indeterminação, indefinição; o prelúdio da aparição.
Estrutura da Mensagem
Na primeira parte, o Brasão: o princípio da nacionalidade em que fundadores e antepassados criaram a pátria.
Na segunda parte, o Mar Português a realização através do mar em que heróis com uma grande missão de descobrir foram construtores do grande destino da Nação.
Na terceira parte, O Encoberto, a morte ou fim das energias latentes é o novo ciclo que se anuncia que trará a regeneração e instaurará um novo tempo.
1.ª Parte
– Brasão –
I – Os campos
1. O dos Castelos
2. O das Quinas
II – Os Castelos
1. Ulisses
2. Viriato
3. O Conde D. Henrique
4. D. Tareja
5. D. Afonso Henriques
6. D. Dinis
7(I). D. João o Primeiro
7(II). D. Filipa de Lencastre
III – Quinas
1. D. Duarte, Rei de Portugal
2. D. Fernando, Inf. de Portugal
3. D. Pedro, Reg. de Portugal
4. D. João, Infante de Portugal
5. D. Sebastião, Rei de Portugal
IV – A Coroa
Nuno Álvares Pereira
V – O Timbre
A Cabeça do grifo: O Infante D. Henrique
Uma Asa do Grifo: D. João o Segundo
A Outra Asa do Grifo: Afonso de Albuquerque
2.ª parte
– Mar Português –
I – O Infante
II – Horizonte
III – Padrão
IV – O Mostrengo
V – Epitafio de Bartolomeu Dias
VI – Os Colombos
VII – Ocidente
VIII – Fernão de Magalhães
IX – Ascensão de Vasco da Gama
X – Mar Português
XI - A Ultima Nau
XII: Prece
3.ª Parte
– O Encoberto –
I – Os Símbolos
1. D. Sebastião
2. O Quinto Império
3. O Desejado
4. As Ilhas Afortunadas
5. O Encoberto
II – Os Avisos
1. O Bandarra
2. António Vieira
3. 'Screvo meu livro à beira-mágoa.
III – Os Tempos
1. Noite
2. Tormenta
3. Calma
4. Antemanhã
5. Nevoeiro
1.ª Parte
•Origem da nossa nacionalidade, destacando-se figuras míticas (“Ulisses” ) e históricas (“ D. Dinis” , “D. Sebastião, Rei de Portugal”, o sonhador, o lutador)
2.ª parte
•Apogeu dos Portugueses conseguido pelas descobertas:
– “ O Infante ”
– “ O Mostrengo ”
– “ Mar Português ”
3.ª Parte
•Fim das energias, simbolizado pelo nevoeiro que envolve Portugal.
•Vinca-se o mito sebastianista com a figura do Encoberto.
•Esperança e impaciência do poeta na vinda do Messias, para a construção do Quinto Império (“Quando é o Rei? Quando é a Hora?” – “Screvo meu libro à beira-mágoa” ).
Ilha dos Amores
Vendo agora a frota em segurança no seu regresso a Portugal, Vénus pede a ajuda do seu filho Cupido para juntar os amores e ferir as nereidas com as flechas do amor. Com as ninfas e Tétis sob esta influência, coloca uma ilha mística na rota dos portugueses, e a ela traz os amantes.
Podem ser Consideradas 3 descrições no episódio da ilha dos Amores
Primeira
O locus amoenus: o cenário onde decorre o encontro amoroso (estrofes 52 a 67 e mais algumas até ao final do canto) é típico do locus amoenus, com os seus chãos maciamente relvados, águas límpidas e cantantes, arvoredos frondosos e até um lago. O poeta fala ainda da simpática fauna que aí se cria e dos frutos que se produzem sem cultivo. É um cenário paradisíaco, idílico, de écloga.
Segunda
A alegoria: com um arrojo inesperado para um maneirista, Camões descreve o encontro dos nautas com as ninfas que os esperavam, industriadas por Vénus. O amor que experimentam é de paixão: imediato, arrebatado e carnal. E fica dado o recado aos que condenam a expressão mais física do amor: «Melhor é experimentá-lo que julgá-lo, Mas julgue-o quem não pode experimentá-lo.»
A recompensa dos portugueses tem um sentido alegórico: «Que as Ninfas do Oceano, tão fermosas, Tethys e a Ilha angélica pintada, Outra cousa não é que as deleitosas Honras que a vida fazem sublimada» (estrofe 89). A terminar o canto, dirigindo-se ao leitor, reforça a intenção alegórica e incita aos feitos de valor: «Impossibilidades não façais, Que quem quis sempre pôde: e numerados Sereis entre os heróis esclarecidos E nesta Ilha de Vénus recebidos».
Estrofe 83
Ó que famintos beijos na floresta,
E que mimoso choro que soava!
Que afagos tão suaves, que ira honesta,
Que em risinhos alegres se tornava!
O que mais passam na manhã, e na sesta,
Que Vénus com prazeres inflamava,
Melhor é experimentá-lo que julgá-lo,
Mas julgue-o quem não pode experimentá-lo.
Terceira
Leonardo: Camões, o indefectível cantor do amor, não quis, e se calhar não pôde, evitar que isso se reflectisse n'Os Lusíadas. Se os amores mal sucedidos do Adamastor deixam entrever o caso real do poeta, Leonardo (estrofes 75 a 82) aqui representa a consumação do seu sonho. Repare-se que as queixas deste navegante recordam as do poeta na lírica e como é um lamento delicado e belo.
Em um pormenor curioso, houve a intenção de separar e dignificar Vasco da Gama na carnalidade do episódio. É acompanhado por Tétis até a um magnífico palácio de cristal e ouro, enquanto os restantes marinheiros e as suas companheiras ficam nas praias e nos bosques.
Canto V
Vasco da Gama conta agora como foi a viagem da armada, de Lisboa a Melinde. É a narrativa da grande aventura marítima, em que os marinheiros observaram maravilhados ou inquietos a costa de África, o Cruzeiro do Sul nos céus desconhecidos do novo hemisfério, o Fogo de Santelmo e a Tromba Marítima, e enfrentaram perigos e obstáculos enormes como a hostilidade dos nativos, no episódio de Fernão Veloso, a fúria de um monstro, no episódio do Gigante Adamastor a doença e a morte provocadas pelo escorbuto.
O Adamastor
Podem-se considerar três partes no episódio do Adamastor, a primeira é uma teofania (estrofes 37 a 40). Chegados ao Cabo das Tormentas no meio da uma tempestade, os marinheiros avistam o titã, tão terrível que “Arrepiam-se as carnes e o cabelo A mi e a todos só de ouvi-lo e vê-lo”. Aqui está o puro pavor, a ameaça iminente da aniquilação, fisicamente sentida, as carnes engelham-se, os cabelos crispam-se.
O espectáculo é envolvente, grandioso, terrificante. Este semideus maléfico, encarnação dos perigos da arriscada travessia, precede-se de uma nuvem negra, que surge rasante sobre as cabeças dos navegantes. Mas mais surpreendente ainda é a orquestração que o mar faz com este elemento aéreo «Bramindo, o mar de longe brada, Como se desse em vão nalgum rochedo». O lado maravilhoso desta aparição também é acentuado, fazendo contrastar todo o espectáculo de disformidade e gigantismo com o cenário precedente, onde são manifestos os encantos de uma noite dos "mares do Sul", «prosperamente os ventos assoprando».
Então começa a segunda parte do episódio (estrofes 41 a 48), que em termos cronológico - narrativos é uma prolepse. O Adamastor fala e, como um oráculo, vaticina o destino cruel que espera alguns dos navegadores que atravessarão os seus domínios. É uma forma inteligente de o poeta dos meados do século falar de acontecimentos do passado, mas que seriam futuros para o navegador do início do século que faz a narração.
Finalmente surge uma écloga marinha (estrofes 49 a 59), que obedece a um desenvolvimento comum a muitas composições líricas de Camões: o enamoramento (de Adamastor por Tétis, não correspondido), a separação forçada (pela titanomaquia), a traição, o lamento pelo sonho frustrado, do qual o sofredor é constante e eternamente recordado: «Enfim, minha grandíssima estatura, Neste remoto cabo converteram Os Deuses, e por mais dobradas mágoas, Me anda Tétis cercando destas águas».
Passado mais este obstáculo, os navegadores agora enfrentam a doença, particularmente o escorbuto, e um clima a que não estão habituados. Apesar de um acolhimento cordial dos povos da África do Sul, o desânimo também aumenta por não haver quem dê notícias sobre a Índia. Até que, depois de Moçambique e Mombaça, a narrativa termina com a alegria da chegada a Melinde.
O canto encerra com a admiração dos melindanos por toda a epopeia portuguesa, e a censura do poeta pela iliteracia dos seus conterrâneos. Pela boca de Vasco da Gama, que lhe empresta legitimidade, conta como os poderosos do mundo, especialmente gregos e romanos, eram amantes das letras. E lamenta que os seus contemporâneos desprezem a língua, a poesia e o cantar e louvar de heróis e povos.
O Velho do Restelo
O canto termina com a partida da armada. Quando estão a despedir-se das famílias na praia de Belém, os navegadores são surpreendidos pelas palavras de um velho que estava entre a multidão. É o episódio do Velho do Restelo (estrofes 94 a 104).
Este personagem é a representação da contestação da época contra as aventuras dos descobrimentos. Havia quem pensasse que era puro orgulho e simplesmente suicídio tentar estes projectos de navegar para partes longínquas do mundo; uma perda de recursos e homens, que fariam falta na luta contra os inimigos mouros ou para a defesa do reino contra uma eventual invasão castelhana.
O episódio entrou no imaginário português. A expressão passou a significar o conservadorismo, o mau agoiro, a má vontade e a falta de espírito de aventura, frente a projectos originais que exigem alguma ousadia e gastos de recursos.
Inês de Castro
Traziam-na os horríficos algozes
Ante o Rei, já movido a piedade:
Mas o povo, com falsas e ferozes
Razões, à morte crua o persuade.
Ela com tristes o piedosas vozes,
Saídas só da mágoa, e saudade
Do seu Príncipe, e filhos que deixava,
Que mais que a própria morte a magoava.
Inês de Castro, estrofe 124 do Canto III
O turbilhão de emoções continua com este episódio lírico-trágico (estrofes 118 a 135), talvez o mais reconhecido d'Os Lusíadas. Convém que se não perca de vista a sua integração no poema, via alocução de Vasco da Gama ao rei de Melinde. Costuma-se classificá-lo como lírico, distinguindo-o assim, sobretudo, dos mais comuns episódios bélicos.
D. Inês e D. Pedro são os amantes trágicos por excelência. O seu amor é ilícito, proibido pelos poderes. O poeta que tinha escrito sonetos tão sombrios, de sofrimento amoroso, chama repetidamente este de «puro amor», e censura o rei, de quem tanto elogiara os feitos guerreiros, por esta sombra no seu reinado.
D. Afonso IV pretende casar o filho que, apaixonado por Inês, recusa. A solução é eliminá-la. Trazida à presença do rei, esta implora pela sua vida, só para poder cuidar dos seus filhos. Comove o velho soberano, mas os conselheiros e o povo exigem a morte. E assim a frágil e bela apaixonada é assassinada «só por ter sujeito O coração a quem soube vencê-la» (por amar quem soube conquistar o seu coração).
Uma rápida análise do episódio permite encontrar aí presentes, com maior ou menor clareza, elementos trágicos como o destino, que conduz a acção para o final trágico; a peripécia; até algo próximo do papel do coro (apóstrofes). A nobreza moral e social dos personagens é também salientada, de modo a criar no leitor sentimentos de terror e de piedade perante a desgraça que se abate sobre a protagonista (catástrofe).
Quando Inês teme mais a orfandade dos filhos que a própria perda da vida, quando ela suplica a comutação da pena capital por um exílio na Sibéria (Cítia) ou na Líbia, entre «toda a feridade», só para poder criar os filhos do seu amor, quando é comparada com «a linda moça Policena, consolação extrema da mãe velha», quando o leitor escuta toda a estrofe 134, e mesmo a 135, estão-se a dedilhar os acordes da piedade.
Já os versos iniciais da estrofe 124, a apóstrofe com que termina a 130 (e antes a da segunda metade da 123) e a estrofe 133 estão ao serviço da sugestão do terror trágico.
Concílio dos Deuses
Neste momento, é convocado o Concílio dos deuses (estâncias 20 a 41) para decidir se os portugueses devem ou não conseguir alcançar o seu destino. Júpiter afirma que sim, porque isso lhes está predestinado.
Segue-se um tumulto, com os restantes olímpicos a tomar partido de Baco ou Vénus, até que o poderoso Marte se impõe, assustando Apolo num aparte (estrofe 37). O amante de Vénus, e admirador dos feitos guerreiros dos portugueses, lembra que não só já é merecido que consigam realizar a sua façanha, como Júpiter já tinha decidido conceder esse favor e não deveria voltar atrás na palavra. O rei dos deuses concorda e encerra o concílio.
O discurso com que Júpiter começa a reunião é uma acabada peça de oratória. Abre com o inevitável exórdio(1ª estrofe) em que, depois de uma original saudação, expõe brevemente o tema a desenvolver. Segue-se, ao modo da retórica antiga, a narração (o passado mostra que a intenção dos fados é mesmo a que o orador apresentou). Vem depois a confirmação: com factos do presente corrobora o que já, a seu modo, a narração comprovara (4ª estrofe). E termina com duas estrofes de peroração, onde se apela à benevolência dos deuses para com os filhos de Luso - aliás, a decisão dos fados cumprir-se-á inexoravelmente. Contra o que seria de esperar, Júpiter conclui determinando e não abrindo o debate.
O Héroi de " Os Lusíadas"
A importância que representa a figura de D. Sebastião para Luís de Camões está bem patente na Dedicatória, logo no início de Os Lusíadas. D. Sebastião é o garante da «Lusitana antiga liberdade», baluarte dos bons valores nacionais, monarca poderoso, predestinado por Deus e, acima de tudo, o líder da reconquista das terras que os Mouros haviam roubado.
Ao dedicar a D. Sebastião Os Lusíadas, Luís de Camões está a frisar a importância da figura de D. Sebastião na identificação de Portugal enquanto pátria com uma história gloriosa, mas, por vezes, não muito abonatória. Gloriosa, porque sendo Portugal um País pequeno, foi pioneiro num período fundamental para a Humanidade, como foi o do alvorecer do Renascimento, ajudando a romper com a Idade Média.
Luís Vaz de Camões não esqueceu o lado negativo, a degradação dos costumes, a ganância provocada pelo tesouro colonial e a exploração dos povos colonizados, fenómenos que constituíram parte das causas da concepção de desconcerto do Mundo de Camões.
Como o título indica, o herói desta epopeia é colectivo, os Lusíadas, ou os filhos de Luso, os portugueses. Nas estrofes iniciais do discurso de Júpiter no concílio dos deuses olímpicos, que abre a parte narrativa, surge a orientação laudatória do autor.
O herói da obra, os portugueses. Monumento aos Descobrimentos Portugueses em Belém, Lisboa, Portugal
"Eternos moradores do luzente
Estelífero pólo, e claro assento,
Se do grande valor da forte gente
De Luso não perdeis o pensamento,
Deveis de ter sabido claramente,
Como é dos fados grandes certo intento,
Que por ela se esqueçam os humanos
De Assírios, Persas, Gregos e Romanos.
Início do discurso de Júpiter no concílio dos deuses, Canto I, estrofe 24.
Havia um ambiente de orgulho e ousadia no povo português. Navegadores e capitães eram heróis recentes da pequena nação, homens capazes de extraordinárias façanhas, como o «Castro forte» (o vice-rei D. João de Castro), falecido poucos anos antes de o poeta aportar na Índia.
E principalmente Vasco da Gama, a quem se devia o descobrimento da rota para o oriente numa viagem difícil e com poucas probabilidades de êxito, e que vencera inúmeras batalhas contra reinos muçulmanos em terras hostis aos cristãos. Esta viagem épica foi por isso usada como história central da obra, à volta da qual vão sendo contados episódios da história de Portugal.
terça-feira, 17 de novembro de 2009
Narração
Este começo da acção central, a viagem da descoberta do caminho marítimo para a Índia, quando os portugueses se encontram já a meio do percurso do canal de Moçambique vai permitir:
A narração do percurso até Melinde (narrador heterodiegético);
A narração da História de Portugal até à viagem (por Vasco da Gama);
A inclusão da narração da primeira parte da viagem;
A apresentação do último troço da viagem (narrador heterodiegético).
Os planos da narração
Os planos da narrativa são constituídos por:
Narração histórica - História de Portugal
Narração da viagem de Vasco da Gama
Narração mitológica - intervenção dos Deuses.
Estrutura Interna e Externa
Um estudo que se pretenda minimamente rigoroso acerca do poema épico de Camões tem de começar, inevitavelmente, por uma análise da sua estrutura externa. E no que se refere a esse aspecto em particular, rapidamente concluímos que é um poema dividido em Cantos (dez Cantos para ser mais preciso), apresentando cada um deles um número variável de estrofes (que, no final, somam um total de 1102). De facto, podemos inferir que o Canto I tem 106 estrofes; o Canto II tem 113; o Canto III tem 143; o Canto IV tem 104; o Canto V tem 100; o Canto VI tem 99; o Canto VII tem 87; o Canto VIII tem 99; o Canto IX tem 95; por fim, o Canto X (por sinal o mais longo) apresenta-se com 156 estrofes.
As estrofes são todas oitavas, ou sejam, possuem 8 versos, que são na sua grande maioria decassílabos heróicos (acentuados na sexta e décima sílabas métricas).
Relativamente à rima, percebemos que ela não só existe como é simultaneamente cruzada e emparelhada, obedecendo ao esquema: a b a b a b c c (rima cruzada nos seis primeiros versos, e emparelhada nos dois últimos).
Estrutura interna…
Passando para a análise da estrutura interna da obra, a primeira conclusão a reter é que Os Lusíadas seguem, com bastante fidelidade, a estrutura clássica da epopeia. Depois, e não fugindo muito ao que acontecia com as obras do mesmo género, verificamos que ela se divide claramente em quatro partes distintas. São elas proposição, invocação, dedicatória e narração.
a) A proposição é a primeira dessas partes, e corresponde às estrofes 1 a 3 do Canto I. Nela, o poeta começa por declarar aquilo sobre o qual vai escrever, e que é, nada mais, nada menos, do que os feitos heróicos dos portugueses, as suas vitórias, conquistas e personagens mais ilustres (salientam-se os navegadores e guerreiros, que transportaram consigo a bandeira do Reino e da Fé aos confins do mundo; os monarcas que, na sua coragem e decisão, permitiram a dilatação do Império; e todos aqueles que, pelas suas obras e feitos, se imortalizaram e se tornaram dignos de admiração).
Na proposição é também possível descortinar todos os quatro planos que posteriormente vão marcar presença ao longo do poema (quatro planos diferentes mas estreitamente articulados entre si):
• o plano da viagem. Não podemos esquecer que foi esta aventura marítima que, acima de tudo, serviu de pretexto à elaboração da epopeia. Neste plano somos confrontados com a narração dos acontecimentos mais significativos da viagem de Vasco da Gama, desde a partida de Lisboa em meados de 1497, até ao momento do regresso. Pelo meio ficam as aventuras sofridas em Mombaça, Melinde, Calecute...
“Que da Ocidental praia Lusitana / Por mares nunca dantes navegados / Passaram ainda além da Taprobana”
• o plano da história de Portugal. Camões aproveita esta oportunidade para fazer uma revisão e uma síntese dos momentos que considera mais importantes e marcantes na história do seu País. Essa história é-nos narrada em ocasiões e por narradores diferentes: primeiro, é Vasco da Gama que conta alguns episódios ao rei de Melinde; segue-se Paulo da Gama que, em Calecute, faz o mesmo em relação ao Catual; depois, os acontecimentos posteriores à viagem são-nos narrados por meio de sonhos e profecias. Este plano é compreensível, na medida em que a intenção do poeta era enaltecer todo o povo português, e não apenas algumas figuras ou episódios.
“E também as memórias gloriosas / Daqueles Reis que foram dilatando / A Fé, o Império, e as terras viciosas”
• o plano dos deuses e da mitologia. Camões imaginou uma forte presença dos deuses pagãos, que rivalizariam entre si e interfeririam na viagem dos portugueses.
“A quem Neptuno e Marte obedeceram”
• o plano do poeta. Luís de Camões não se inibe de expressar opiniões e conselhos, avisos e reprimendas, lamentações e comentários, muitas vezes falando na primeira pessoa. As considerações pessoais aparecem normalmente no final dos cantos e constituem, de um modo geral, a visão crítica do poeta sobre o seu tempo.
“Que eu canto o peito ilustre Lusitano”
b) Na invocação, o poeta pede auxílio a entidades mitológicas (conhecidas pela designação de musas), no sentido de estas lhe fornecerem toda a inspiração e engenho que a criação de uma obra literária desta envergadura exigia. Esta atitude era comum por entre os poetas clássicos, para quem a criação artística era fruto de uma inspiração exterior, vinda de fora, dos tais seres mitológicos e sobrenaturais.
Logo no início do Canto I, mais precisamente nas estrofes 4 e 5, assistimos à invocação das Tágides (ou ninfas do Tejo). Em outros momentos fulcrais da narração, a invocação reaparece: no Canto II, estrofes 1 e 2, faz um apelo a Calíope (musa da eloquência e da poesia épica); no Canto VII, estrofes 78 a 87, invoca as Ninfas do Tejo e do Mondego; no Canto X, estrofes 8 e 9, faz um novo um apelo a Calíope, sempre no sentido de conseguir a inspiração que tanto deseja para narrar as impressionantes aventuras dos portugueses.
c) Na dedicatória (que corresponde às estrofes 6 a 18, do Canto I), o poeta Camões dedica o seu texto ao monarca D. Sebastião, a quem tece inúmeros elogios e oferece alguns conselhos (particularmente no sentido de prosseguir as campanhas militares contra os infiéis, não só para que o triunfo da Fé e do Império sejam indiscutíveis, mas para que o próprio D. Sebastião se torna digno de ser cantado). Por outro lado, era no monarca que recaíam todas as esperanças e expectativas para dissipar quaisquer prenúncios de decadência.
Nota: ter em atenção que a dedicatória não costumava fazer parte da estrutura das epopeias clássicas.
d) No que toca à narração, esta constitui o núcleo central da epopeia, sendo basicamente a concretização de tudo aquilo que o poeta se propôs fazer na proposição. A narração começa no Canto I, estrofe 19, para só terminar no final do último Canto. Lado a lado, irão sendo narrados os episódios dos deuses greco-romanos (que, com toda a atenção, seguiam cada passo dos arrojados marinheiros), e a história da nossa Nação, desde as origens de Portugal ao rei D. Manuel; desde a viagem de Vasco da Gama às profecias dos deuses e sonhos das personagens (referimo-nos por exemplo ao sonho de D. Manuel, que levantava o pano sobre os eventos que aconteceriam no futuro).
Um último aspecto a ter em conta é que a narração, à maneira clássica, se inicia “in medias res”, isto é, quando a viagem de Vasco da Gama e seus companheiros já vai a meio (“Já no largo oceano navegavam”). O poeta decidiu assim não narrar os acontecimentos em sucessão cronológica, conferindo maior beleza ao texto, e evitando que ele se assemelhasse em demasia a uma crónica ou diário.
Fontes de Inspiração dos Lusíadas
Históricas:
- Para a viagem do Gama e feitos no Oriente: os historiadores quinhentistas (Barros, Castanheda e outros).
- Para a Idade Média: os cronistas (Fernão Lopes, Zurara, Rui Pina, Galvão).
- História Trágico-Marítima.
Estéticas:
- As epopeias homéricas (a Ilíada e a Odisseia) sobretudo a Eneida, de Virgílio.
- Ovídio (sugestões mitológicas).
- Orlando Furioso do humanista italiano Ariosto (para a estrutura estrófica - oitava rima).
Obras de carácter cientifico (geógrafos antigos, etc.) e filosófico; Bíblia e Doutores da Igreja.
Biografia de Luís de Camões
Nasceu a 1524 ou 1525, segundo documentos publicados por Faria e Sousa, em Lisboa ou em Coimbra (a data e o local do seu nascimento não são certos). Segundo registo da lista de embarque para o Oriente do ano de 1550, declara-se que Luís de Camões se inscrevera e, nesse registo, é-lhe atribuída a idade de 25 anos.
O Padre Manuel Correia que o conheceu pessoalmente, dá-o nascido em 1517. Filho de Simão Vaz de Camões e Ana de Sá Macedo, família nobre estabelecida em Portugal na época de D. Fernando, foi educado sob o império do Humanismo, estudou em Coimbra de
Era esse mesmo seu tio sacerdote e sábio que o auxiliava nos estudos, mas ainda antes de Luís de Camões acabar o seu curso, partiu para Lisboa, talvez para conhecer melhor a principal cidade do seu país visto que gostava imenso da História de Portugal.
Reinava D. João II e, como Camões era fidalgo, podia frequentar as festas e saraus da corte no palácio real; e foi lá que conheceu aquela que ele queria que viesse a ser a sua esposa, D. Catarina de Ataíde.
Devido à rigorosa tradição da corte, Camões teve que se afastar desta linda menina a quem ele tratava por um nome inventado de Natércia nos seus muitos poemas consagrados, e foi exilado por ordem do rei para o Ribatejo (Constância), onde permaneceu durante dois anos até que se alistou como soldado e partiu para Ceuta.
Foi nesta viagem que Camões primeiro avaliou o esforço formidável de um povo audacioso (corajoso) e persistente, que foi capaz de vencer os difíceis obstáculos desta travessia, de forma pioneira.
Apesar de ter sido um grande poeta, foi também um grande patriota e um grande soldado. Defendeu Portugal tanto nas guerras em África como na Ásia. Em 1547, partiu para Ceuta depois de ter estado na corte de
Três anos mais tarde voltou a Portugal e teve vários duelos, num dos quais feriu Gonçalo Borges, moço de arreios de D. João III, o que lhe custou um ano de prisão no Tronco. Diz-se que foi nesse ano de prisão que Camões compôs o primeiro canto da sua obra “Os Lusíadas”.
Obteve a liberdade como promessa de embarcar para a Índia como simples homem de guerra e embarcou para Goa em 1553, onde conviveu com o vice-rei D. Francisco de Sousa Coutinho e com o Dr. Garcia de Orta e manteve também relações amistosas com Diogo do Couto, o continuador das Décadas.
Foi aí que escreveu o “Auto de Filodemo”, o qual representou para o governador Francisco Barreto. Ainda na Índia compôs uma ode a D. Constantino de Bragança, em que o defendia de acusações supostamente falsas que lhe eram feitas. Da Índia passou a Macau, onde os portugueses tinham fundado uma colónia mesmo em frente ao mar. Aqui conheceu Jau António, companheiro que esteve sempre com ele até à morte e lhe fez companhia enquanto cantava em seis cantos os feitos dos portugueses numa gruta em frente ao mar.
Foi chamado a Goa mas, no caminho para a Índia o barco onde navegava naufragou junto à foz do rio Mekong, e diz-se que ele tenha ido até à costa a nado só com um dos braços, visto no outro levar consigo a sua tão próspera obra.
Foi a descida do Oceano Atlântico, a passagem do Cabo da Boa Esperança e todas aquelas paragens que levaram Camões a glorificar na sua obra os lugares por onde a armada de Vasco da Gama tinha já passado, lugares esses que muito custaram a "descobrir", razão ainda para dignificar o povo lusitano.
Regressou a Lisboa em 1569 e, em 1572, publicou “Os Lusíadas”. Foi-lhe concedida por D. Sebastião uma tença anual de 15 mil reis que só recebeu durante três anos, pois faleceu no dia 10 de Junho de 1580 em Lisboa, na miséria, vivendo de esmolas que se dizia terem sido angariadas pelo seu fiel criado Jau. O seu enterro teve de ser feito a expensas de uma instituição de beneficência, a Companhia dos Cortesãos.
Após a sua morte, foi D. Gonçalo Coutinho que mandou esculpir na sua pedra o seguinte letreiro: “Aqui Jaz Luís de Camões Príncipe dos Poetas de seu Tempo. Viveu Pobre e Miseravelmente e Assim Morreu. - Esta campa lhe mandou pôr D. Gonçalo Coutinho, na qual se não enterrará pessoa alguma.”
A comemoração do dia da sua morte, é actualmente relembrado como o “Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas”, sendo feriado nacional.
terça-feira, 20 de outubro de 2009
Carta de Fernando Pessoa a Adolfo Casais Monteiro
Caixa Postal 147
Lisboa, 13 de Janeiro de 1935
Meu prezado Camarada,
Muito lhe agradeço a sua carta, a que vou responder imediatamente e integralmente. Antes de, propriamente, começar, quero pedir-lhe desculpa de lhe escrever neste papel de cópia. Acabou-se-me o decente, é domingo, e não posso arranjar outro. Mas mais vale, creio, o mau papel que o adiamento.
Em primeiro lugar, quero dizer-lhe que nunca eu veria «outras razões» em qualquer coisa que escrevesse, discordando, a meu respeito, sou um dos poucos poetas portugueses que não decretou a sua própria infalibilidade, nem toma qualquer crítica que se lhe faça, como um acto de lesa-divindade. Além disso, quaisquer que sejam os meus defeitos mentais, é nula em mim a tendência para a mania da perseguição. Á parte isso, conheço já suficientemente a sua independência mental, que, se me é permitido dizê-lo, muito aprovo e louvo. Nunca me propus ser Mestre ou Chefe – Mestre, porque não sei ensinar, nem sei se teria que ensinar; Chefe, porque não sei estrelar ovos. Não se preocupe, pois, em qualquer ocasião, com o que tenha de dizer a meu respeito. Não procuro caves nos andares nobres.
Concordo absolutamente consigo em que não foi feliz a estreia, que de mim mesmo fiz com um livro de natureza da Mensagem. Sou, de facto, um nacionalista místico, um sebastianista racional. Mas sou, à parte isso, e até em contradição com isso, muitas outras coisas. E essas coisas, pela mesma natureza do livro, a Mensagem não as inclui.
Comecei por esse livro as minhas publicações pela simples razão de que foi o primeiro livro que consegui, não sei porquê, ter organizado e pronto. Como estava pronto, devo dizer, com os olhos postos no prémio do Secretariado, embora nisso não houvesse pecado intelectual de maior. O meu livro estava pronto em Setembro, e eu julgava, até, que não poderia concorrer ao prémio, pois ignorava que o prazo para a entrega dos livros, que primitivamente fora até ao fim de Julho, fora alargado até ao fim de Outubro. Como, porém, em fim de Outubro já havia exemplares da Mensagem, fiz entrega dos que o Secretariado exigia. O livro estava exactamente nas condições (nacionalismo) de concorrer. Concorri.
Quando ás vezes pensava na ordem de uma futura publicação de obras minhas, nunca um livro do género de Mensagem figurava em número um. Hesitava entre se deveria começar por um livro de versos grandes – um livros de umas 350 páginas -, englobando as diversas subpersonalidades de Fernando Pessoa ele mesmo, ou se deveria abrir com uma novela policiaria, que ainda não consegui completar.
Concordo consigo, disse, em que não foi feliz a estreia, que de mim mesmo fiz com a publicação da Mensagem. Mas concordo com os factos que foi a melhor estreia que eu poderia fazer. Precisamente porque esta faceta – em certo modo secundária – da minha personalidade não tinha nunca sido suficientemente manifestada nas minhas colaborações em revistas (excepto no caso do Mar Português, parte deste mesmo livro) – precisamente por isso convinha que ela aparecesse, e que aparecesse agora. Coincidiu, sem que eu o planeasse ou o premeditasse (sou incapaz de premeditação prática), com um dos momentos críticos (no sentido original da palavra) da remodelação do subconsciente nacional. O que fiz por acaso e se completou por conversa, fora exactamente talhado, com a Esquadria e o Compasso, pelo Grande Arquitecto.
(Interrompo. Não estou doido nem bêbado. Estou, porém, escrevendo directamente, tão depressa quanto a máquina mo permite, e vou-me servindo das expressões que me ocorrem, sem olhar a que literatura haja nelas. Suponha – e fará bem em supor, porque é verdade – que estou simplesmente falando consigo.)
Respondo agora directamente às suas três perguntas: (1) Plano futuro da publicação das minhas obras, (2) génese dos meus heterónimos, e (3) ocultismo.
Feita, nas condições que lhe indiquei, a publicação da Mensagem, que é uma manifestação unilateral, tenciono prosseguir da seguinte maneira. Estou agora completando uma versão totalmente remodelada do Banqueiro Anarquista; essa deve estar pronta em breve e conto, desde que esteja pronta, publicá-la imediatamente. Se assim fizer, traduzo imediatamente este escrito para inglês, e vou ver se o posso publicar
Referi-me, como viu, ao Fernando Pessoa só. Não penso nada do Caeiro, do Ricardo Reis ou do Álvaro de Campos. Nada disso poderei fazer, no sentido de publicar, excepto quando (ver mais acima) me for dado o Prémio Nobel. E contudo – penso-o com tristeza – pus no Caeiro todo o meu poder de despersonalização dramática, pus
Creio que respondi à sua primeira pergunta.
Se fui omisso, diga
Passo agora a responder à sua pergunta sobre a génese dos meus heterónimos. Vou ver se consigo responder-lhe completamente.
Começo pela parte psiquiátrica. A origem dos meus heterónimos é o fundo traço de histeria que existe
Isto explica, tant bien que mal, a origem orgânica do meu heteronimismo. Vou agora fazer-lhe a história directa dos meus heterónimos. Começo por aqueles que morreram, e de alguns dos quais já não me lembro – os que jazem perdidos no passado remoto da minha infância quase esquecida.
Desde criança, tive a tendência para criar em meu torno um mundo fictício, de me cercar de amigos e conhecidos que nunca existiram. (Não sei, bem entendido, se realmente não existiram, ou se sou eu que não existo. Nestas coisas, como em todas, não devemos ser dogmáticos.) Desde que me conheço como sendo aquilo a que chamo eu, me lembro de precisar mentalmente, em figura, movimentos, carácter e história, várias figuras irreais que eram para mim tão visíveis e minhas como as coisas daquilo a que chamamos, porventura abusivamente, a vida real. Esta tendência, que me vem desde que me lembro de ser um eu, tem-me acompanhado sempre, mudando um pouco o tipo de música com que me encanta, mas não alterando nunca a sua maneira de encantar.
Lembro, assim, o que me parece ter sido o meu primeiro heterónimo, ou antes, o meu primeiro conhecido inexistente – um certo Chavalier de Pas dos meus seis anos, por quem escrevia cartas dele a mim mesmo, e cuja figura, não inteiramente vaga, ainda conquista aquela parte da minha afeição que confina com a saudade. Lembro-me, com menos nitidez, de uma outra figura, cujo nome já não me ocorre mas que o tinha estrangeiro também, que era não sei quê, um rival do Chevalier de Pas… Coisas que acontecem a todas as crianças? Sem dúvida – ou talvez. Mas a tal ponto as vivi que as vivo ainda, pois que as relembro de tal modo que é mister um esforço para me fazer saber que não foram realidades.
Esta tendência para criar em torno de mim um outro mundo, igual a este mas com outra gente, nunca me saiu da imaginação. Teve várias fases, entre as quais esta, sucedida já
(Em eu começando a falar – e escrever à máquina é para mim falar -, custa-me a encontrar o travão. Basta de maçada para si, Casais Monteiro! Vou entrar na génese dos meus heterónimos literários, que é afinal, o que V. quer saber. Em todo o caso, o que vai dito acima dá-lhe a história da mãe que os deu à luz.)
Aí por 1912, salvo erro (que nunca pode ser grande), veio-me à ideia escrever uns poemas de índole pagã. Esbocei umas coisas em verso irregular (não no estilo Álvaro de Campos, mas num estilo de meia irregularidade), e abandonei o caso. Esboçara-se-me, contudo, numa penumbra mal urdida, um vago retrato da pessoa que estava a fazer aquilo. (Tinha nascido, sem que eu soubesse, o Ricardo Reis.)
Ano e meio, ou dois anos depois, lembrei-me um dia de fazer uma partida ao Sá-Carneiro – de inventar um poeta bucólico, de espécie complicada, e apresentar-lho, já me não lembro como, em qualquer espécie de realidade. Levei uns dias a elaborar o poeta mas nada consegui. Num dia em que finalmente desistira – foi em 8 de Março de 1914 – acerquei-me de uma cómoda alta, e tomando um papel, comecei a escrever, de pé, como escrevo sempre que posso. E escrevi trinta e tantos poemas a fio, numa espécie de êxtase cuja natureza não conseguirei definir. Foi o dia triunfal da minha vida, e nunca poderei ter outro assim. Abri com um título, O Guardador de Rebanhos. E o que se seguiu foi o aparecimento de alguém em mim, a quem dei desde logo o nome de Alberto Caeiro. Desculpe-me o absurdo da frase: aparecera em mim o meu mestre. Foi essa a sensação imediata que tive. E tanto assim que, escritos que foram esses trinta e tantos poemas, imediatamente peguei noutro papel e escrevi, a fio, também, os seis poemas que constituem a Chuva Oblíqua, de Fernando Pessoa. Imediatamente e totalmente… Foi o regresso de Fernando Pessoa-Alberto Caeiro a Fernando Pessoa ele só. Ou melhor, foi a reacção de Fernando Pessoa contra a sai própria inexistência como Alberto Caeiro.
Aparecido Alberto Caeiro, tratei logo de lhe descobrir – instintiva e subconscientemente – uns discípulos. Arranquei do seu falso paganismo o Ricardo Reis latente, descobri-lhe o nome, e ajustei-o a si mesmo, porque nessa altura já o via. E, de repente, e em derivação oposta à de Ricardo Reis, surgiu-me impetuosamente um novo individuo. Num jacto, e à máquina de escrever, sem interrupção nem emenda, surgiu a Ode Triunfal de Álvaro de Campos – a Ode com esse nome e o homem com o nome que tem.
Criei, então, uma coterie inexistente. Fixei aquilo tudo em moldes de realidade. Graduei as influências, conheci as amizades, ouvi, dentro de mim, as discussões e as divergências de critérios, e em tudo isto me parece que fui eu, criador de tudo, o menos que ali houve. Parece que tudo se passou independentemente de mim, e parece que assim ainda se passa. Se algum dia eu puder publicar a discussão estética entre Ricardo Reis e Álvaro de Campos, verá como eles são diferentes, e como eu não sou nada na matéria.
Quando foi da publicação de Orpheu, foi preciso, à última hora, arranjar qualquer coisa para completar o número de páginas. Sugeri então ao Sá-Carneiro que eu fizesse um poema «antigo» do Álvaro de Campos – um poema de como o Álvaro de Campos seria antes de ter conhecido Caeiro e ter caído sob a sua influência. E assim fiz o Opiário, em que tentei dar todas as tendências latentes do Álvaro de Campos, conforme haviam de ser depois reveladas, mas sem haver ainda qualquer traço de contacto com o seu mestre Caeiro. Foi, dos poemas que tenho escrito, o que me deu mais que fazer, pelo duplo poder de despersonalização que tive de desenvolver. Mas, enfim, creio que não saiu mau, e que dá o Álvaro em botão…
Creio que lhe expliquei a origem dos meus heterónimos. Se há porém qualquer ponto em que precisa de um esclarecimento mais lúcido – estou escrevendo depressa, e quando escrevo depressa não sou muito lúcido - , diga, que de bom grado lho darei. E, é verdade, um complemento verdadeiro e histérico: ao escrever certos passos das Notas para recordação do meu Mestre Caeiro, do Álvaro de Campos, tenho chorado lágrimas verdadeiras. É para que saiba com quem está lidando, meu caro Casais Monteiro!
Mais uns apontamentos nesta matéria… Eu vejo diante de mim, no espaço incolor mas real do sonho, as caras, os gestos de Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos. Construí-lhes as idades e as vidas. Ricardo Reis nasceu em 1887 (não me lembro do dia e do mês, mas tenho-os algures), no Porto, é médico e está presentemente no Brasil. Alberto Caeiro nasceu em 1889 e morreu em 1915; nasceu em Lisboa mas viveu quase toda a sua vida no campo. Não teve profissão, nem educação quase alguma. Álvaro de Campos nasceu em Tavira, no dia 15 de Outubro de 1890 (às 1.30 da tarde, diz-me o Ferreira Gomes; e é verdade, pois, feito o horóscopo para essa hora, está certo). Este, como sabe, é engenheiro naval (por Glasgow), mas agora está aqui em Lisboa
Como escrevo em nome destes três? Caeiro, por pira e inesperada inspiração, sem saber ou sequer calcular que iria escrever. Ricardo Reis, depois de uma deliberação abstracta, que subitamente se concretiza numa ode. Campos, quando sinto um súbito impulso para escrever e não sei o quê. (O meu semi-heterónimo Bernardo Soares, que aliás em muitas coisas se parece com Álvaro de Campos, aparece sempre que estou cansado ou sonolento, de sorte que tenha um pouco suspensas as qualidades de raciocínio e de inibição; aquela prosa é um constante devaneio. É um semi-heterónimo porque, não sendo a personalidade a minha, é, não diferente da minha, mas uma simples mutilação dela. Sou eu menos o raciocínio e a afectividade. A prosa, salvo o que o raciocínio dá de ténue à minha, é igual a esta, e o português perfeitamente igual; ao passo que Caeiro escrevia mal o português, Campos razoavelmente mas com lapsos como dizer «eu próprio» em vez de «eu mesmo», etc. Reis melhor do que eu, mas com um purismo que considero exagerado. O difícil para mim é escrever a prosa de Reis – ainda inédita – ou de Campos. A simulação é mais fácil, até porque é mais espontânea em verso.)
Nesta altura estará o Casais Monteiro pensando que má sorte o fez cair, por leitura, em meio de um manicómio. Em todo o caso, o pior de tudo isto é a incoerência com que o tenho escrito. Repito, porém: escrevo como se estivesse falando consigo, para que possa escrever imediatamente. Não sendo assim, passariam meses sem eu conseguir escrever.
Falta responder à sua pergunta quanto ao ocultismo. Pergunta-me se creio no ocultismo. Feita assim, a pergunta não é bem clara; compreendo porém a intenção e a ela respondo. Creio na existência de mundos superiores ao nosso e de habitantes nesses mundos, em existências de diversos graus de espiritualidade, subtilizando-se até se chegar a um Ente Supremo, que presumivelmente criou este mundo. Pode ser que haja outros Entes, igualmente supremos, que hajam criado outros universos, e que esses universos co-existam com o nosso, interpenetradamente ou não. Por estas razões, e ainda outras, a Ordem Externa do ocultismo, ou seja a Maçonaria, evita (excepto a Maçonaria Anglo-Saxónica) a expressão «Deus», dadas as suas implicações teológicas e populares, e prefere dizer «Grande Arquitecto do Universo», expressão que deixa em branco o problema de se ele é Criador ou simplesmente Governador, do mundo. Dadas essas escalas de seres, não creio na comunicação directa com Deus, mas, segundo a nossa afinação espiritual, poderemos ir comunicando com seres cada vez mais altos. Há três caminhos para o oculto: o caminho mágico (incluindo práticas como as do espiritismo, intelectualmente ao nível da bruxaria, que é magia também), caminho esse extremamente perigoso, em todos os sentido; o caminho místico, que não tem propriamente perigos, mas é incerto e lento; e o que se chama o caminho alquímico, o mais difícil e o mais perfeito de todos, porque envolve uma transmutação da própria personalidade que a prepara, sem grandesriscos, antes com defesas que os outros caminhos não têm. Quanto a «iniciação» ou não, posso dizer-lhe só isto, que não sei se responde à sua pergunta: não pertenço a Ordem Iniciática nenhuma. A citação, epigrafe ao meu poema Eros e Psyche, de um trecho (traduzido, pois o Ritual é em latim) do Ritual do Terceiro Grau da Ordem Templária de Portugal, indica simplesmente – o que é facto – que me foi permitido folhear os Rituais dos três primeiros graus dessa Ordem, extinta, ou em dormência, desde cerca de 1888. se não estivesse em dormência, eu não citaria o trecho do ritual, pois se não devem citar (indicando a origem) trechos de Rituais que estão em trabalho.
Creio assim, meu querido Camarada, ter respondido, ainda com certa incoerência às suas perguntas. Se há outras que deseja fazer, não hesite
Abraça-o camarada que muito o estima e admira,
Fernando Pessoa.
P.S. (!!!)
Além da cópia que normalmente tiro para mim, quando escrevo à maquinam de qualquer carta que involve explicações da orden das que esta contém, tirei uma cópia suplementar, tanto para o caso de esta carta se extraviar, como para o de, possivelmente, ser-ljhe precisa para qualquer outro fim. Essa cópia está sempre ás suas ordens.
Outra coisa. Pode ser que, para qualquer estudo seu, ou outro fim análogo, o Casais Monteiro precise, no futuro, de citar qualquer passo desta carta. Fica desde já autorizado a fazê-lo, mas com uma reserva, e peço-lhe licença para lha acentuar. O parágrafo sobre o ocultismo, na página 7 da minha carta, não pode ser reproduzido em letra impressa. Desejando responder o mais claramente possível à sua pergunta, saí propositadamente um pouco fora dos limites que são naturais nesta matéria. Trata-se de uma carta particular, e por isso não hesitei
Continuo em divida para consigo da carta ultra-devida sobre os seus últimos livros. Mantenho o que creio que lhe disse na minha carta anterior: quando agora (creio que será só em Fevereiro) passar alguns dias no Estoril, porei essa correspondência em ordem, pois estou em divida, nessa matéria, não só para consigo, mas também com várias outras pessoas.
Ocorre-me perguntar de novo uma coisa que já lhe perguntei e que me não respondeu: recebeu os meus folhetos de versos em inglês, que há tempos lhe enviei?
«Para meu governo», como se diz em linguagem comercial, pedia-lhe que me indicasse o mais depressa possível que recebeu esta carta. Obrigado.
F. Pessoa.